Professor do PPGSGA chama a atenção para os impactos ambientais de materiais, que contêm metais pesados e que podem contaminar água, ar e solo - Veja entrevista com Prof. Renan Angrizani

Reciclagem de eletrônicos enfrenta desafios

Luzes, telas, sons. Conexão, agilidade e memória. Símbolos de status, que rapidamente se apagam. O silêncio metálico de carcaças que deixam de vibrar. Os aparelhos eletrônicos precisam ter um destino correto, seja para a reciclagem ou para o descarte correto. Sem uso, eles costumam ficar por anos guardados em armários e gavetas.

Segundo relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), de 2024, o Brasil é o segundo país das Américas que mais produz lixo eletrônico, ficando atrás apenas dos Estados Unidos. Estima-se que foram produzidas 2,4 milhões de toneladas deste tipo de resíduo no Brasil no ano passado. Destes, apenas 3% tiveram destinação correta. No mundo, seriam reciclados 22,3% do total. Diante deste cenário, políticas públicas e investimento em educação ambiental despontam como essenciais para que a produção tecnológica se torne sustentável.

A Cooperativa de Trabalho Social de Egressos, Familiares de Egressos e de Reeducandos de Sorocaba e Região (Coopereso) atua em Sorocaba com a coleta de resíduos, inclusive aparelhos eletrônicos e elétricos. São recebidos cerca de 500 quilos desses materiais por dia. Essa quantidade, no entanto, poderia ser bem maior.

Uma parte dos aparelhos é desmontada e encaminhada para outras empresas que tratarão dos demais passos da reciclagem, enquanto os objetos em melhor condição, ou que passaram por algum pequeno reparo, ficam à disposição no galpão podendo ser comprados por visitantes.

Lixo eletrônico, segundo a definição da ONU, é um fluxo de resíduos especiais compostos por diversos elementos, tais como metais pesados, peças miniaturizadas, baterias e tomadas. Muitas empresas que produzem materiais eletrônicos fazem a recolha, em um movimento de logística reversa, no qual os materiais voltam para a indústria de origem para serem corretamente descartados ou reaproveitados.

O professor Renan Angrizani, doutor em ciências ambientais, e do Programa de Pós-Graduação em Sustentabilidade na Gestão Ambiental da UFSCar Sorocaba (PPGSGA), chama a atenção para os impactos ambientais desses materiais, que contêm metais pesados e que podem contaminar água, ar e solo. Ele aponta ainda para o risco de escassez, pois a maior parte das matérias-primas utilizadas vem de fontes não renováveis.

No Brasil, o decreto 10.240 de 2020 estabelece normas para a implementação de sistema de logística reversa obrigatória de produtos eletroeletrônicos estabelecendo responsabilidades para todos os integrantes da cadeia como fabricantes, comerciantes e consumidores, na qual cada um tem suas responsabilidades para o correto manejo dos resíduos. O decreto determina ainda a criação de pontos de coleta para estes materiais.

O processo de reciclagem do lixo eletrônico começa com a coleta (1), depois passa para a separação (2). Após isso, os materiais seguem para desmontagem (3), processamento (4) e reaproveitamento (5) dos materiais. Por fim, tudo o que não for reaproveitado é descartado da maneira correta.

Galpões

A Coopereso mantém dois galpões em Sorocaba, um no Jardim Leocádia e outro no Jardim Zulmira, este especializado nos resíduos eletrônicos. Além das três primeiras etapas do processo de reciclagem dos eletrônicos, a associação também realiza pequenos consertos, quando possível, ou reutiliza algumas peças para a criação de outras coisas, como por exemplo transformar motor de geladeiras em compressores de ar.

Beatriz Ribeiro de Oliveira está na cooperativa há 15 anos e tem consciência da importância do seu trabalho para a economia circular e a preservação do meio ambiente.

Miraci Cugler, presidente da cooperativa, ressalta que — além do material eletrônico — todo o lixo poderia ser reciclado, ou reaproveitado, como por exemplo os alimentos descartados, que poderiam ser utilizados para compostagem, adubando plantas ou outras finalidades.

Em algumas regiões como no Pará, por exemplo, restos de comida são utilizados para a produção de biogás.

A Coopereso também recebe materiais apreendidos pela polícia, como máquinas de caça-níquel, que passam pelo processo de reciclagem. A técnica de segurança do trabalho, Jeniffer Valente, alerta para os riscos da desmontagem de alguns aparelhos, como televisões antigas, de tubo, que possuem chumbo em sua composição. Nesse caso, a cooperativa encaminha o aparelho para empresas especializadas.

A Prefeitura de Sorocaba disponibiliza quatro ecopontos nos quais é permitido o descarte de materiais como entulho, móveis e lixo eletrônico. Esses ecopontos ficam na Vila Helena, Cajuru, Júlio de Mesquita Filho e Vila Hortência. Funcionam de segunda a sexta-feira, das 7h às 17h, e aos sábados, das 7h às 12h.

Questões

O professor Rodrigo Barchi, especialista em educação ambiental e gestão da educação pública, indica que toda a lógica produtiva atual é complexa e leva ao problema do lixo eletrônico. A educação ambiental, segundo ele, não deve se ater somente à questão do descarte correto, mas levantar questões sobre toda a cadeia, desde a redução do consumo e a exigência popular por produtos duráveis.

A obsolescência programada, por exemplo, é um problema social sério, no qual bens são produzidos para terem uma vida útil pré-determinada, não por limitação técnica, mas para garantir que a cadeia de consumo continuará a girar, ressalta Barchi. (Vernihu Oswaldo).

Fonte: Jornal Cruzeiro do Sul. Edição de 09/06/2025. Link